sexta-feira, 28 de agosto de 2015

Black Sabbath - Black Sabbath


Ano de lançamento: 1970


Felipe:
É público e notório que o Heavy Metal começou no início dos anos 70 com a trindade diabólica Led Zeppelin / Deep Purple / Black Sabbath. Essas bandas desenvolveram um som encorpado e distorcido, com riffs pesados e sonoridades em tons menores e sombrios, com muitas referências ao ocultismo. Mas dos três grupos ingleses, o Sabbath é o mais identificado com o gênero, considerado o primeiro de metal propriamente dito. E foi em Black Sabbath, álbum homônimo de estreia, que o fogo do inferno começou a incendiar de verdade a porra toda.

Em pouco mais de meia hora, quatro rapazes ingleses de origem pobre, com péssimos empregos e sem perspectivas de futuro, pegam o que havia de mais sinistro no blues e criam todo um universo macabro, influenciados por filmes de terror. “Black Sabbath” é o título de um filme com Boris Karloff, que no Brasil se chama “As Três Máscaras do Terror”.

Se formos dissecar o Heavy Metal do Sabbath pra trás, em ordem cronológica, vamos encontrar os riffs de blues pesado do Cream (quantas vezes já vi gente ouvindo Cream e confundindo com Black Sabbath?); Jagger tirando a camisa em Rock n’ Roll Circus e exibindo o corpo pintado com figuras demoníacas enquanto cantava Sympathy for the Devil; Joe Cocker possuído em Woodstock berrando With a Little Help From My Friends; o trítono de Hendrix em Purple Haze; os Beatles mandando tudo à merda em Helter Skelter – uma das canções mais pesadas já gravadas por uma banda até então; a microfonia do Who quebrando os instrumentos no palco; Steppenwolf e seu “heavy metal thunder”; os Beatles de novo ao incluir Aleister Crowley entre seus ídolos na capa de Sgt Pepper’s e os Stones com Paint it Black, até chegar nos bluesmen da Chess e, mais pra trás, em Robert Johnson caindo de joelhos numa encruzilhada fazendo um pacto – que seria cobrado - com as forças das trevas.

Voltando mais ainda, vamos encontrar escravos chicoteados e estuprados entoando cânticos e spirituals no sul dos Estados Unidos ou em navios negreiros. Pode-se até chegar na África, onde sons de ritos tribais invocavam sabe-se lá que tipo de capeta. A sacada genial de Ozzy e cia foi pegar tudo isso, incluir mais mitologia, misticismo, roupas pretas e cruzes invertidas e falar diretamente para uma geração fodida que começava a sofrer as consequências da Guerra do Vietnã e do fim da utopia dos anos 60.  

A polêmica começa na capa: a foto de uma mulher macabra em frente de uma casa velha ainda mais sinistra. Pra piorar, não se sabe nada sobre o fotógrafo nem sobre a estranha figura feminina, que parece uma bruxa parada entre as árvores de um bosque. Medo. Os caras foram tachados de anticristos, pois o encarte interno trazia uma cruz invertida e um texto que evoca espíritos e bruxaria, fazendo referência à mulher da capa.

O álbum abre com o som de chuva e sinos tocando, seguido do riff sinistro da canção também homônima (na verdade a música deu o nome à banda). E a capetice tem início, com Ozzy falando sobre uma “figura de preto” que aponta pra ele com olhos de fogo e o sorriso de Satã. Depois lamenta, repleto de medo e lamúria: “Oh não, Deus, por favor me ajude!”.    

The Wizard é uma blueseira com Ozzy tocando gaita. Lembre-se de que o Sabbath era inicialmente uma banda de blues.  Outro destaque é, claro, “N.I.B.", verdadeiro hino do rock n’ roll e grande clássico da banda. A letra fantástica traz uma declaração de amor em primeira pessoa, em que a pessoa amada deve esquecer a vida que teve antes de encontrá-lo, apenas para, no último verso, ouvirmos: “Meu nome é Lúcifer, por favor, pegue minha mão”.

Com tanta vibração ruim, o álbum fez com que uma legião de malucos, pseudobruxos, membros da família Manson e lunáticos em geral levassem tudo a sério e seguissem a banda de cidade em cidade, com oferendas, sangue e bichos mortos. O que irritava profundamente os caras, que estavam mais preocupados - segundo eles – em cheirar o máximo de cocaína e beber o máximo de álcool que a vida de rockstar pudesse proporcionar.    

De qualquer forma, Black Sabbath é um dos discos mais importantes de todos os tempos. Uma dica: escute-o assistindo o filme “A Noite dos Mortos-Vivos”, de George Romero, filme de terror independente de 1968 em preto-e-branco. Coloque o filme no mudo, o disco no máximo, apague a luz e faça a cabeça. Mais cool impossível. Só não garanto que você vai dormir depois.

Nota: 10/10



Rafael:
Falar sobre mitos é difícil. Mitos parecem ter saído do éter como se sempre existissem. Tem-se a impressão de que todos sabem, todos conhecem e tudo foi falado a respeito. Tem contornos de obras feitas por deuses, não por humanos. Assim é a história do nascimento do primeiro álbum do Black Sabbath, uma história construída por quatro jovens desacreditados e pessimistas de Birmingham, Inglaterra, e que, inconscientemente criaram com um disco e sete músicas um gênero musical novo.

Assim como numa boa mitologia como a de Hércules, o álbum foi gravado em 12 horas. Para acrescer ao mito, lançado numa sexta-feira 13 de 1970. Hard rock até aquele momento não era novidade: a juventude ansiava por um som mais pesado, agressivo e denso que refletisse suas angústias e descontentamento com o fim do sonho que John Lennon havia dito em "God". Led Zeppelin, Cream, Jimi Hendrix, Deep Purple, Blue Cheer, todos já haviam gravado discos de rock pesado. Mas o Black Sabbath levou o Hard Rock por um outro caminho que seus pares, um caminho lógico mas que ninguém enxergava: engoliram e desconstruiram blues e jazz e disfarçaram o pop com um manto negro.

De suas deficiências, a inventividade: o fato de Tony Iommi ter perdido a ponta dos dedos da mão direita num acidente numa fábrica fizeram que ele mudasse a afinação da guitarra para conseguir tocar. Isto contribuiu para que surgisse um som massivo e pesado distinto de seus pares nos anos 70. Gezze Butler era um " baixista improvisado" à época e como não sabia fazer linhas melódicas próprias de baixo, "seguia" o que Tony estava fazendo, adicionando, também, mais peso ao som. O que faltava a Ozzy Osbourne em qualidade vocal era compensado pela sua interpretação insana e presença nos palcos. E Bill Ward tocava sua bateria como se fosse um troglodita tocando   jazz.

O álbum se inicia ao som de chuva e sinos e o riff em trítono (que na era medieval era abolida das músicas por sua dissonância, que recebia o nome de Diabolus in Musica) na faixa que dá o nome ao disco e à banda dita o tom do que se ouvirá dali em diante: o medo e a adoração ao oculto, à magia e ao diabo. Marcante também é o solo de baixo que precede um dos riffs mais conhecidos e marcantes da história do rock em N.I.B; a gaita sinistra tocada por Ozzy na homenagem à Gandalf (quando Tolkien não era cool) em The Wizard e as covers de Evil Woman e The Warning que, dada a qualidade das versões, ninguém se lembra que não são músicas próprias do Sabbath.

Em seu ápice criativo (de 1970 a 75) o Black Sabbath aperfeiçoou o estilo Heavy Metal em Paranoid, aprofundou no soturno e na psicodelia macabra em Masters of Reality, moldou seu som para as arenas em Vol. 4, expandiu suas possibilidades sonoras no eclético Sabbath Bloody Sabbath e flertou com outros gêneros, como progressivo no paranóico Sabotage. No entanto, tudo isto tinha uma semente no monolito negro fincado na história da música pop que se ouve em Black Sabbath.

Nota: jura que precisa falar?


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