terça-feira, 3 de novembro de 2015

Urge Overkill - Exit The Dragon


Ano de lançamento: 1995


Rafael:
O ano é 1994 e Pulp Fiction é lançado. Em seu segundo filme, Quentin Tarantino consolida o que veríamos ao longo de sua carreira: histórias e narrativas fora do comum, recheadas de referências pop e trilhas sonoras repletas de obscuridades e hits esquecidos que só seriam ouvidos em rádios universitárias de madrugada. Em meio a medalhões e raridades do passado, Quentin resgata uma cover fiel, mas anacrônica e, por isto, estranha, de uma canção de Neil Diamond, extraída de um EP de 1992 de uma banda cujo nome remeteria muito mais a representantes de Metal Britânico dos anos 80 que a uma banda de rock dos anos 90. “Girl, You’ll Be a Woman Soon” se torna hit, e o Urge Overkill poderia, enfim, ser abraçado pelo grande público.

A questão é que o grande público cria expectativas reconfortantes e simplistas. Óbvio que queriam variações sobre o mesmo hit. E o Urge Overkill não pode ser tomado tão somente por esta música. Formada no final dos anos 80, a banda tinha como integrantes principais Nash Kato (guitarras e vocais), Eddie “King” Roeser (baixo e vocais) e Black Onassis (bateria) e bebiam tanto da atitude “Do It Yourself” e a estética lo-fi do pós-punk e hardcore quanto dos grandes sons e riffs e da pompa e pose do rock de arena.

Até o momento da canção ter estourado, o Urge Overkill já havia lançado quatro álbuns e em Saturation, de 1993, ganham força dentro do circuito de rádios alternativas e consolidam sua reputação no circuito alternativo. Considerado hoje em dia um clássico perdido da década de 90, Saturation é uma celebração irônica da vida de popstars de uma banda que era tudo, menos isto. Grandes riffs, crescendos apoteóticos que mascaram temas sombrios e depressivos, tudo envelopado numa produção brilhante que remontava a quando bandas poser dominavam as rádios e a MTV. Da frustração do sucesso que não se concretizava nem com o impulso de um grande hit, do ímpeto de seguir suas convicções artísticas, do crescente abuso de drogas de Black Onassis e dos atritos entre Kato e Roeser nasce Exit The Dragon.

Ao pressentir que este álbum seria seu canto de cisne (uma verdade até 2004, quando a banda se reuniu novamente), Exit The Dragon é, também, um disco mais longo e experimental do que até então já havia sido feito. “Eu sou o mal do mundo” é a primeira frase dita logo no início do álbum, na tensa Jaywalkin’, e se estabelece um tom diferente do que já se esperaria da banda. O pessimismo e desilusão de Roeser é ouvido também no pastiche de metal de There´s no Place; o riff que remete à rock de arena contrabalanceado por uma letra claustrofóbica de pós-punk em Take Me; Tin Foil soa como um outtake perdido de Replacements; o arremedo de shoegaze na depressiva The Mistake, um pedido de socorro direto de Black Onassis para seus vícios (“Cuidado com a overdose” é entoado ao final do refrão). Nash Kato, por sua vez, arrisca mais no instrumental, mas não ameniza nos temas: há a ironia cafajeste sob a superfície descaradamente pop em Somebody Else’s Body (com direito a bongôs e naipes de metal escondidos sob o mix) e uma das frases mais sacanas que pode ser dita em um relacionamento: “Oh, querida, você é tudo para mim, mas de vez em quando eu preciso de mais e parece que quanto mais eu tenho mais eu quero”; a decepção com as pessoas, religião e a vida em geral no folk orquestrado de View of The Rain; a analogia de relacionamentos a jogos de tabuleiro em Monopoly (com a sacada dúbia de “Você é o seu próprio Monopólio” no refrão); e a conclusão agridoce de Digital Black Epilogue, uma versão para os anos 90 de “You Can´t Always Get What You Want”.

Com uma combinação estranha como essa, não era de se esperar menos que Exit The Dragon fosse visto à época como um suicídio comercial de uma banda que tinha apenas ensaiado uma decolagem na carreira. É fato também que foram fiéis aos seus ideais artísticos, para o bem e para o mal. Reuniram novamente nos anos 2000, já sem Black Onassis, e lançaram em 2011 um novo álbum, de forma totalmente independente. E esta é a verdadeira essência do Urge Overkill: mirar alto, tocar como se fossem grandes, mas admitir que, na verdade, seu som é para poucos. E esses poucos agradecem que assim seja.

Nota: 9/10


Felipe:
Nos anos 70, após a morte de Bruce Lee, o cinema oriental viu surgir um novo gênero conhecido como “Bruceploitation”: filmes de baixo orçamento, protagonizados por sósias do mestre das artes marciais e baseados em sua filmografia. Dentre essas “pérolas” do lado B da sétima arte chinesa, há o filme “Exit the Dragon, Enter the Tiger”, de 1976, protagonizado por um look-alike chamado – veja só – Bruce Li e baseado em “Enter the Dragon”, filme do Bruce Lee original de 1973. 

Em 1995, o Urge Overkill, banda de rock alternativo do guitarrista Nash Kato, fã de Bruce Lee - cujo próprio nome artístico foi inspirado no personagem do lutador na série de TV dos anos 60 “Besouro Verde” - lançou Exit the Dragon. Apesar do nome em referência ao colorido e divertido Brucepoitation, o álbum trouxe temas obscuros, como maldade, drogas e solidão. 

Numa primeira audição, o disco parece não convencer. Falta liga nas músicas, muito bem produzidas, mas meio sem sal. A faixa que abre o álbum, “Jaywalkin”, uma declaração de desilusão com o mundo e as pessoas (“Eu sou o mal nesse mundo, eu sou o mal em você, há muita maldade, é verdade, e não há nada que você possa fazer”) já mostra o que o ouvinte pode esperar das outras 13 músicas. 

O clima vai ser esse durante 61 minutos, como mostra a bela balada psicológica “Somebody Else's Body” (“...está terminado quando você está no corpo de alguma outra pessoa, na cabeça de outro alguém / no corpo de outra pessoa, quando eu estou com outro alguém/ quando você está no corpo de alguma outra pessoa, na cama de outro alguém”).

A segunda faixa, “The Break”, deve ser uma homenagem ao David Bowie, pois o riff é muito parecido com “Rebel, Rebel”. O Clash, por exemplo, já fez isso usando o riff (ou algo muito parecido) de "I Can't Explain” do The Who em “Clash City Rockers”.

"The Mistake" é outra faixa interessante, falando de drogas e alertando para o perigo real e muitas vezes ignorado de uma overdose (“Mistake / be careful what you take / You've got a lot at stake, more than you'll ever know / Beware the overdose, beware the overdose”).

A letra de “The Mistake” ainda menciona o tal dragão solto: “you'll never find the time for slackin', never gonna make it today, until you finally exit the dragon”. Vale lembrar que “perseguir o dragão” (“chasing the dragon") é uma gíria espalhada pelos junkies nos guetos de Hong Kong e adjacências, que significa usar drogas como heroína, morfina e ópio. 

Não fosse o tema, essa faixa poderia estar em qualquer álbum do Radiohead. Também parece Beatles, com direito a guitarra slide chorando gentilmente no estilo George Harrison, bateria hipnótica tipo Ringo Starr e piano maroto pontuando o refrão no melhor estilo Help e Rubber Soul, além dos vocais meio Thom Yorke meio Lennon/McCartney. 

O Urge Overkill vai ser sempre lembrado como “a banda da música do Pulp Fiction”, no caso, “Girl, You’ll Be a Woman Soon”. A canção de Neil Diamond passou a ser deles após a versão “definitiva” pro filme de Tarantino e, se não é uma pérola eterna do cancionário popular ocidental, certamente é no mínimo melhor do que tudo em Exit the Dragon.

Os maiores êxitos do álbum me lembram um Replacements num disco sem muita inspiração. Há boas canções que, isoladas, mereceriam bastante atenção. Em conjunto, elas meio que deixam a desejar. Ou eu posso simplesmente estar falando merda mesmo. Escute você e me diga o que acha.

Nota: 7,5/10








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